PROFECIA DE CASSANDRA


A formação ou capacitação é momento essencial na vida de todo o profissional. Qualquer que seja a nossa atividade, é sempre bom, se se quer obter resultados satisfatórios, dedicar momentos para a realização de estudos e aperfeiçoamentos. E mais: estudos e aperfeiçoamentos, mas que se adequem às novas exigências e demandas impostas pelo devir, pelo vir a ser constante do nosso mundo vivencial.
Como profissionais precisamos entender que a nossa prática profissional, o nosso trabalho diário necessita estar sempre antenado com as exigências do nosso meio. Precisamos refletir sobre as nossas práticas e vivências do mundo do trabalho para compreendermos se as novas circunstâncias exigem novos métodos, novas práticas, outras intervenções.
E com o trabalho de professor não é diferente. Quem assume o magistério, admite a missão grandiosa, de formação da alma, que exige, sem dúvida alguma, muita habilidade e competência para realiza-la.
Do professor, espera-se, que seja também educador, ou seja, aquele que contribui para a formação da personalidade, proporcionando o desenvolvimento de competências não somente cognitivas, mas também sociais e afetivas. Acontece que para tal mister, exige-se uma formação adequada, onde o pretendente ao magistério tenha condições, ao concluir o curso de pedagogia ou licenciatura, de assumir uma sala de aula e preparado para transformar a mesma em ambiente de aprendizagens significativas.
Vejo que os cursos de licenciatura e pedagogia não devem correr o risco de transformar o professor em um simples informador e transmissor de conhecimentos, teorias e regras.
O magistério exige além dos conhecimentos das disciplinas e conteúdos a compreensão do universo discente. O trabalho de professor exige, não somente que ele domine os conteúdos; é necessário mais ainda, ou seja, que tenha um conhecimento mais amplo dos seus alunos. Não é suficiente apenas saber se eles estão bem em determinada matéria ou componente curricular. É imprescindível conhecer os contextos, compreender o aluno nas dimensões emocional, social, cultural, ética. E isto é possível, mas desde que o professor tenha passado por uma formação com estudos e orientações nesse sentido.
Acontece que muitos cursos de pedagogia e licenciatura estão formando professores, fisicamente presentes, mas pedagogicamente muito distantes da realidade dos alunos e distantes da sala de aula. Esses cursos estão mesmo distantes – não digo todos – de proporcionar ao professor as condições necessárias para formar o tão propalado aluno crítico e cidadão.
Pesquisa da Fundação Carlos Chagas encomendada pela Fundação Victor Civita revelou que as disciplinas com conhecimentos específicos sobre a docência (voltadas à prática e às didáticas específicas) representam, no máximo, 30% da carga horária dessas graduações. Podemos inferir, a partir desse percentual, que essas faculdades não estão trabalhando com os pretendentes a professor para o que ensinar, o como ensinar e para a compreensão do universo discente. Esses cursos estão afastados da realidade das nossas escolas.
Segundo a apreciação do prof. Libâneo muitos cursos de pedagogia não dão conta de preparar o professor com a qualidade que se exige hoje desse profissional.
Muitos desses cursos se distanciam da realidade do aluno que temos, e se concentram em modelos estranhos à realidade brasileira. Muitos cursos de pedagogia e licenciaturas planejam seus currículos importando teorias de intelectuais que desconhecem o nosso chão, nosso alunos com suas necessidade e idiossincrasias – erros recorrentes.
A realidade é que muitos professores conhecem os seus alunos apenas no plano cognitivo, na dimensão intelectual. Acontece que o aluno não se resume à malha intelectiva, ele é também um ser de emoções, está inserido numa cultura, faz parte um contexto social, possui uma família, tem uma maneira própria de ver o mundo, tem preocupações, problemas e muitas outras coisas que fazem parte da sua vida e que não podem ser desprezadas pelo professor.
O ser humano não é uma máquina, um robô – sem sensações e emoções - para ser programado e condicionado.
É sempre interessante àqueles que estão cursando alguns desses cursos, fazer uma análise do que realmente tem sido proveitoso, verificando se os conteúdos e temas trabalhados têm alguma relação com a realidade dos alunos e das escolas que temos, não somente das capitais, mas também dos lugares mais afastados.
É interessante também verificar a nota desses cursos no Enad (órgão, que mede a qualidade do ensino superior). Mas será sempre necessário que os professores sempre procurem pesquisar e observar sobre a realidade das nossas escolas, sobre métodos, sobre o que ensinar, sobre o como ensinar e sobre a realidade daqueles que iremos trabalhar, ou seja, os alunos.
Diante de tudo isso os varões de Plutarco elaboram, à revelia dos profissionais do magistério, medida provisória para modificar o ensino médio e com foco na retirada de conteúdos e sem tocar na questão fulcral, que é a valorização dos professores.
Os doutores do MEC – sempre tergiversando - ainda não perceberam que para melhorar a educação é preciso, a priori, valorizar o professor, inicialmente com formação docente de alta qualidade e melhoria salarial.
Para os cursos de pedagogia e licenciaturas que não funcionam a contento e nada fazem para melhorar, não há razão para que continuem funcionando. E parece que esta realidade não tem sensibilizado os doutores da educação. Não existe preocupação com a qualidade da formação docente.
O pensamento dos donos do poder é antinômico, ou seja, planejam melhorar o ensino médio e elaboram PEC, que congela investimentos em educação por vinte anos.
O problema está sempre se repetindo e os doutores não enxergam e se negam a apontar e intervir sobre as causas. Os discursos são sempre os mesmos, as ações que não alcançam resultados positivos são recorrentes. Estamos sempre ouvindo a esma coisa. Tudo tem sido parolagem flácida para dormitar bovinos.
Compreendo que para atuarmos sobre um problema - de forma eficiente e eficaz - é sempre necessário conhecê-lo nas suas mais variadas dimensões. Isso permite encontrarmos os elementos geradores e, por conseguinte buscar as soluções. Se há uma intervenção sobre determinado problema e os mesmo continuam se repetindo é porque a intervenção foi falha, ineficaz.
- Há uma velha história – retirada do livro “Violência”, p. 17, do filósofo e psicanalista esloveno, Slavoj Zizek - sobre um trabalhador suspeito de roubar no trabalho: todas as tardes, quando sai da fábrica, os guardas inspecionam cuidadosamente o carrinho de mão que ele empurra, mas nunca encontram nada. Está sempre vazio. Até que um dia cai a ficha: o que o trabalhador rouba são os carrinhos de mão... O mesmo parece se repetir com a educação: ainda não descobriram que o objeto é o “carro de mão”.
Do jeito que as coisas caminham - conforme a vontade e interesses dos donos do poder - não há como vislumbrar melhoria da educação e, consequentemente, o desenvolvimento do nosso país, nos próximos vinte anos.
Sem valorizar o professor não há como melhorar a educação, não há como atingir as metas do Ideb e obter resultados satisfatórios nas avaliações internacionais. Valorizar o professor com melhoria salarial e oferecendo formação inicial e continuada de qualidade, ou seja, preparando os nossos mestres para o enfrentamento das situações diárias das nossas escolas.
Claro que este não é o único passo, mas é por ele que devemos iniciar. Ignorar este caminho é o mesmo que acelerar a materialização das PROFECIAS DE CASSANDRA.

Saudações pedagógicas

Dagoberto Diniz